Professora cria curso on-line preparatório para o Enem Libras

João Gomes

Enem Libras é específico para surdos que forem realizar o exame

O Exame Nacional do Ensino Médio – Enem em Libras, promovido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP desde 2017 por videoprovas, teve sua versão do exame aplicada nos dias 17 e 24 de janeiro de 2021.

Para auxiliar estudantes surdos na realização do Enem Libras, a professora Bruna Enne, graduada em Engenharia Química pela Universidade Federal Fluminense – UFF em Niterói, criou durante a pandemia uma plataforma on-line específica na Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Bruna explica que o Sinaliza Enem não é um curso para a tradução e interpretação, mas um pré-vestibular totalmente em Libras voltado para o Enem, com foco em matemática, física, química, biologia, geografia e redação.

Durante a graduação, Bruna participou de grupos de intérpretes de Libras e percebeu um universo menos inclusivo para os surdos dentro da universidade. Começou a aprender Libras numa instituição religiosa e agora visa se especializar na área e até fazer a uma graduação em Letras/Libras.

Como conheceu a Língua Brasileira dos Sinais?

A estudante se inseriu em projetos como mediadora bilíngue, de bolsas de estudos em museologia, centros de ciência e acessibilidade em museus de Niterói e também no Spread the Sign (dicionário on-line com mais de 30 línguas de sinais do mundo, tendo como objetivo proporcionar ao surdo o intercâmbio com outros países).

A pandemia impulsionou a Engenheira Química a dar aulas como intérprete de Libras em um pré-vestibular. Ela relata que no primeiro dia as aulas eram todas em português e não tinham interpretação por falta de intérpretes e, por isso, os responsáveis mudaram o público do pré-vestibular.

— Não encontrei outro pré-vestibular que fosse em Libras, por isso, decidi criar o Sinaliza Enem, que é uma plataforma on-line exclusiva para surdos. Muitos cursos digitais traduzem as aulas e raramente o intérprete consegue explicar tudo — disse.

— Sou eu que ensino todas as disciplinas e que gravo as videoaulas, mas não sou formada na área, tenho professores para consultoria e validação das aulas — falou.

Como funciona a plataforma em Libras

O acesso ao conteúdo é de fevereiro a novembro, com o pagamento de taxa única anual, sendo o valor de R$ 240 por disciplina, por meio do site. O pacote de redação custa R$ 400 e dá direito a avaliações sistemáticas dos textos por professores.

Segundo Enne, é realizado um cronograma individual para cada aluno do início ao fim, com grupos em redes sociais para manter contato, estreitar a relação e ter o acompanhamento individual.

A partir do atendimento individual, o desempenho do aluno em cada matéria é avaliado no decorrer do curso, mas tem estudantes surdos que preferem fazer só o módulo de redação, por exemplo, por ter facilidade nas outras disciplinas. A plataforma é aberta para escolha.

As diferenças entre a plataforma do Inep e o Sinaliza Enem

A plataforma do Inep em Libras passa por adaptações, mas Bruna evidencia que nem todas as disciplinas estão disponíveis e o acompanhamento não é individual, o que não permite perceber a evolução de cada aluno nos estudos.

— No Sinaliza Enem utilizamos metodologias específicas, questões adaptadas, estudamos as provas anteriores do Enem Libras junto com o estudante para ele entender o trabalho do Inep antes de realizar a prova — explicou a professora.

A única prova que tem em Libras é o Enem. Por isso, além da preparação para o exame, Bruna destaca que o curso também aborda o Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e inclui testes vocacionais voltados para o psicológico, para que o foco seja mesmo no aluno e não na prova.

Para a professora o Enem Libras só foi criado em 2017, porque é um trabalho bem complexo do Inep, sendo necessário encontrar maneiras de explicar para os surdos de vários estados a mesma coisa e ser o mais justo possível na aplicação do exame.

Enem Libras ou em português para os surdos, qual a melhor opção?

— Por estar respaldado por Lei que o surdo tem direito à Libras como primeira língua, então vejo como essencial essa adaptação. Muitos surdos ainda preferem fazer a prova em português. O ideal é disponibilizar as duas opções — destacou.

— O Enem altera algumas questões para o surdo na prova, por exemplo, aquelas que envolvem ondas sonoras e microfones. Quando se fala em unificar as duas provas, esquecemos que alguns tópicos não podem ser abordados. Você até consegue ensinar como funciona um aparelho de áudio, mas não é da realidade deles — explicou.

Desafios da comunidade surda no Brasil

Eu acho que o principal desafio é integrar os surdos com a comunidade em geral. O contato com a aprendizagem geralmente acontece só na escola, pois a maioria dos pais e familiares são ouvintes. Aqui é uma questão de socialização, vai além da linguística, tem que ter a vivencia. O surdo tem que ter acesso à informação e comunicação fora da escola.

Na graduação hoje, o número de surdos é baixo, mas se crescer significativamente, o que acredito que vai acontecer, as faculdades vão ter que se adaptar em todos os cursos.

O próximo passo agora no pré-vestibular é continuar a preparação para o Enem de 2021, aprofundando os temas, questões culturais, acesso a livros, literatura brasileira e estrangeira e focar em como apresentar a língua portuguesa ao surdo adaptada para sua realidade.

Assista a um trecho da entrevista com a professora Bruna Enne:

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